quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Reflexões sobre dor crônica

A Associação Internacional dos Estudos da Dor define a sensação como uma experiência física e emocional desagradável, associada ou relacionada à lesão real ou potencial dos tecidos.

A dor é uma experiência complexa que envolve o estímulo de algo nocivo e as respostas fisiológicas e emocionais a um evento. Existem dois tipos de dor: aguda e crônica. A aguda pode durar segundos, dias ou semanas, ocorre como um sinal de alerta após cirurgias, traumatismo, queimaduras, inflamação ou infecção. Já a dor crônica ou persistente pode durar meses ou anos.

Dores na coluna vertebral, ciatalgias, neuropatias, fibromialgia, lesões por esforços repetitivos (LER) e câncer também podem gerar esse tipo de dor. A dor aguda não tratada adequadamente pode evoluir para a dor crônica e se torna a própria doença do paciente. Conviver com essa sensação não leva apenas ao desconforto, mas compromete o bem-estar social e emocional do indivíduo, que pode sentir-se isolado, ansioso ou deprimido, além de afetar a produtividade no trabalho, o apetite e o sono.

Percebemos muitas vezes a dor como um sintoma aparentemente sem relação com uma causa devido as nossas percepções e paradigmas que nos servem de base. Inversamente quando encontramos a “causa”, essa causa é somente um achado dentro de nossa esfera de conhecimento e de forma alguma representa a totalidade que envolve a realidade clínica do paciente. Não raro nos deparamos muitas vezes com profissionais de distintas áreas que podem possuir um bom conhecimento dentro de sua formação, porém ainda assim limitados frente à complexidade da estrutura humana. Quando um indivíduo se depara com um quadro de dor aguda, normalmente faz uso de anti-inflamatórios e analgésicos. Essa conduta pode gerar alívio, ou mesmo eliminar a sintomatologia caso se trate de uma disfunção leve. Mas, se o quadro envolver maior complexidade ou gravidade, essa atitude apenas mascara temporariamente os sintomas e permite à pessoa fazer movimentos que não faria se não estivesse sob o uso de medicação. Dessa forma perde-se o alerta fornecido pelo nosso próprio corpo e as limitações que a disfunção impõe para a preservação da integridade estrutural. Quando a pessoa busca ajuda profissional muitas vezes o processo que era agudo torna-se crônico, pois não é raro perder algumas semanas realizando exames complementares e refletindo sobre qual abordagem terapêutica irá realizar. Ao iniciar um tratamento, nem sempre o profissional terá a capacidade para atuar em todos os níveis de comprometimento, o que torna o resultado do tratamento limitado. Uma abordagem multimodal com atenção multidisciplinar é o melhor caminho para quem sofre de dores crônicas.

O tratamento da dor crônica envolve paciência, persistência e também uma reeducação dos hábitos de vida. Muitos pacientes com dores crônicas não tem sucesso no tratamento devido à tendência de desistir tão logo apresente alguma melhora no seu quadro. A falta de esclarecimento e diálogo entre profissional/paciente faz com que o paciente não compreenda com clareza o seu problema e o que deve fazer ou evitar para que a melhora seja efetiva. Sempre que nos depararmos com o fenômeno da dor devemos prestar atenção em alguns pontos: O que provoca a dor? O que alivia a dor? Qual horário a dor se manifesta? A Qualidade e intensidade da dor (pontada, em queimação, surda...; Quais movimentos pioram a sensação dolorosa e quais podem ser realizados sem dor ou que proporcionam alívio; Apresenta dormência ou perda de força? Quais os locais onde a dor se manifesta, há irradiação? Quando sente dor, ocorre algum outro sinal associado? (Ex: quando tem enxaqueca sente azia e queimação no estômago). Essas informações são muito importantes para o profissional que irá avaliá-lo, e não somente para o profissional, mas também para uma melhor consciência do paciente sobre a sua totalidade estrutural, bioenergética e uma maior responsabilidade no reestabelecimento e manutenção da sua saúde e bem-estar.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Síndrome do Túnel do Carpo


    A síndrome do túnel do carpo é uma condição descrita comumente pela compressão do nervo mediano por um canal chamado túnel do carpo. Essa compressão pode manifestar-se devido à alterações hormonais, gestação, atividades repetitivas e sobrecarga física.
    Estruturalmente devemos levar em consideração que o sistema nervoso não se divide. É uma peça única e suas divisões são apenas didáticas. Partindo desse pressuposto, a dor em um local nem sempre é proveniente do local onde o sintoma se manifesta. No caso da síndrome do túnel do carpo as compressões podem ter origem na coluna cervical, no espaço entre a primeira costela e a clavícula, na musculatura do pescoço, na região do cotovelo, na musculatura do antebraço e finalmente no túnel do carpo...



    Normalmente quem sofre de síndrome do túnel do carpo pode referir sintomas locais, mas com o passar do tempo, pode referir uma sintomatologia mais extensa, podendo manifestar dor nos cotovelos, braços e na musculatura da cabeça e pescoço. Esses sintomas podem piorar dependendo do posicionamento, o que pode gerar noites com sono pouco restaurador devido aos sintomas de dormências e formigamentos. Esses sintomas nos fornecem indícios de comprometimento das raízes nervosas do plexo cervical (imagem acima).

    Analisando como a população lida com essa disfunção, vemos que a grande maioria ainda utiliza recursos pouco eficazes para lidar com esse quadro. Muitas pessoas utilizam anti-inflamatórios por longos períodos de tempo gerando reações adversas. Outros buscam através da imobilização o alívio temporário dos sintomas. Se analisarmos que uma compressão não envolve necessariamente inflamação, principalmente em quadros crônicos, e que a imobilização reduz o fluxo sanguíneo e também de outros fluídos orgânicos, como a associação de anti-inflamatórios e imobilização com tipóias e munhequeiras poderia favorecer uma melhora significativa?
O tratamento através da terapia manual ortopédica é simples, visa descomprimir as raízes nervosas, promover o deslizamento/mobilização neural, eliminar a dor, restaurar o movimento e a força muscular. A combinação com a medicina chinesa (acupuntura, fitoterapia, auriculoterapia, etc.) permite uma reabilitação ainda mais rápida e eficaz, pois leva em consideração outros fatores (alimentares, psíquicos e climáticos) que podem interferir fisiologicamente e manifestar-se em determinadas áreas ou trajetos do nosso corpo.

 (Abaixo uma demonstração de mobilização neural associado à liberação miofascial. O vídeo serve apenas como uma referência e não representa uma abordagem completa.)



 

terça-feira, 13 de maio de 2014

Hérnia de Disco – É possível tratar sem cirurgia?


Atualmente as disfunções vertebrais envolvendo protusões discais afetam cerca de 2 a 3% da população, tendo uma prevalência maior em homens do que em mulheres acima de 35 anos. A partir dos 16 anos de idade, a degeneração discal e o desarranjo interno do disco podem iniciar o seu processo. Em algumas pessoas isso ocorre devido a alguma disfunção biomecânica, atividade física inadequada, fatores hereditários e genéticos. O desarranjo interno do disco ainda não é uma hérnia, nem podemos dizer se ele irá ou não gerar uma protusão discal, mas é o início de um processo que pode culminar em lesões de maior gravidade.

Inicialmente os sintomas podem passar despercebidos pela população por não conhecerem os sintomas das disfunções discais. Muitos pensam em dores lancinantes quando se fala em hérnia de disco, mas em muitos casos o problema começa a se revelar quando surgem pequenas “dormências” e dores difusas de intensidade leve nos membros inferiores. Quando as manifestações de dormência e falta de força se manifestam nos pés, especialmente no hálux (dedão do pé), no dorso do pé (entre o 1º e 2º dedo) e na face lateral do pé, na região do 4º e 5º dedos, temos um sinal indicativo de compressão nervosa. Nesses casos o melhor é procurar ajuda profissional para realizar o diagnóstico normalmente associado a exames por imagem. Normalmente o processo de instalação do desarranjo interno do disco que pode evoluir para uma hérnia de disco é assintomático, silencioso, mas em condições biomecânicas favoráveis à lesão, pode manifestar-se subitamente provocando o quadro no qual o indivíduo fica “travado” sem conseguir retificar a sua postura e acompanhado de dor aguda. Nessas condições, o desespero pela remissão do quadro pode levar algumas pessoas a buscarem alguma forma de tratamento convencional para melhora dos sintomas e retorno das suas atividades. É importante salientar que quem sofre de um evento como esse quer livrar-se o mais rápido possível da dor, pode desejar alívio imediato através de técnicas invasivas ou até cirúrgicas, que também fazem parte das possibilidades a serem adotadas, porém, devem entrar em ação apenas quando outras formas de reabilitação não promoveram resultados satisfatórios.

O método de tratamento que uma pessoa escolhe é sempre uma decisão pessoal e não deve ser induzida por qualquer profissional da saúde que atue nessas disfunções tais como o médico, fisioterapeuta, osteopata, quiropraxista. Algumas abordagens terapêuticas mostram maior eficácia em determinado momento do tratamento dessas desordens, porém nenhuma delas é absoluta servindo como um método 100% eficaz na reabilitação dessas disfunções. Isso é devido de que algumas modalidades terapêuticas dão mais importância ao aspecto biomecânico da disfunção, outras ao componente neural, à estabilização do segmento afetado. Algumas modalidades procuram distribuir as tensões agindo sobre as áreas com hipomobilidade/hipermobilidade para uma melhor funcionalidade biomecânica reduzindo a sobrecarga em áreas com mais mobilidade e favorecendo o movimento em áreas mais rígidas. Com todas essas questões envolvidas em um único processo, muitas vezes os profissionais e pacientes encontram-se diante de um grande dilema... Profissionais que procuram assimilar em seu arsenal terapêutico abordagens distintas, porém complementares, são os que possuem uma maior probabilidade de atingir uma reabilitação satisfatória. A tendência atual é uma abordagem multimodal, ou seja, o profissional possui formação em várias modalidades terapêuticas para corrigir o distúrbio primário e todos os fatores associados que contribuem para a evolução patológica do quadro. Como somos constituídos por ossos, articulações, discos intervertebrais, cartilagens, músculos, ligamentos, tecido conjuntivo, tecido vascular, visceral, neural, todos esses fatores podem interferir e perpetuar a cascata degenerativa e impedir que o tratamento alcance o resultado esperado. A comunicação entre o profissional e o paciente deve ser esclarecedora para que ele possa compreender as fases do tratamento, as metas a serem atingidas, bem como possíveis limitações. Na primeira sessão o paciente deve ser instruído sobre todos os aspectos da sua disfunção, compreender os mecanismos da sua lesão, o que ele pode e deve fazer em casa, pois o tratamento para ter sucesso deve ter cooperação e dedicação por parte do paciente. Cuidados, prescrições de pausas regulares, indicação precisa de exercícios específicos que devem ser feitos em casa são necessários para produzir uma melhora positiva e progressiva. As principais causas de insucesso são: - Diagnóstico impreciso do profissional que elabora e efetua um tratamento que não corresponde com a etapa do quadro clínico do paciente; - Comunicação insuficiente entre profissional / paciente. - Falta de compromisso do paciente em realizar as indicações prescritas pelo profissional, dependendo completamente da atuação do profissional na sua recuperação. - Doenças como diabetes, alterações biomecânicas significativas e fumo prejudicam a evolução positiva do tratamento. Os fatores que conduzem ao sucesso são:
- Diagnóstico preciso, abordagem correta em relação ao quadro clínico presente.
- Compreensão dos sinais clínicos e das diversas disfunções associadas ao processo patológico principal que podem ser fatores perpetuantes da disfunção primária.
- Boa comunicação profissional / paciente.
- Compromisso do paciente com o tratamento.

 Inicialmente o tratamento visa proporcionar o alívio da dor através da descompressão do local afetado ao mesmo tempo em que promove a estabilização segmentar da região envolvida. A dificuldade na reabilitação reside no fato de que muitos profissionais não possuem uma formação abrangente, que permita promover a melhora em todos os fatores associados que incidem sobre a disfunção discal.



A estabilização segmentar precoce, de forma suave sem provocar estímulo doloroso também é aplicada precocemente, visando recuperar a função estabilizadora e diminuir o estresse da musculatura motora.
As técnicas de mobilização neural e articular permitem melhorar a mobilidade e plasticidade fisiológica do sistema nervoso, quando associadas à estabilização do segmento envolvido e ao relaxamento da musculatura motora promovem uma maior estabilidade, melhora da mobilidade e redução da dor. A abordagem Makenzie é utilizada para melhorar a mobilidade e produzir a centralização da dor, dessa forma a dor irradiada vai gradualmente retornando dos membros     inferiores em direção ao foco da lesão, que significa uma evolução positiva do tratamento.

Na última etapa do tratamento a estabilização segmentar visa fortalecer a musculatura estabilizadora, promover maior consciência corporal e a partir desse ponto, passa a fazer parte da vida do paciente, melhorando sua saúde e qualidade de vida e também prevenindo futuras lesões.

Cerca de 66% dos casos de pacientes com hérnia discal que foram tratados cirurgicamente não tinham uma indicação absoluta dessa intervenção. Necessitavam na verdade de um bom esclarecimento e o estabelecimento adequado plano de tratamento. A hérnia discal não é um processo irreversível, mas um processo que demanda perseverança, paciência, entendimento correto e aplicação correta de técnicas específicas durante a evolução do tratamento.